Entrevista



Erwin Lutzer - Mentiras sobre Deus



Da Redação
Erwin Lutzer é mestre em teologia pelo Seminário Teológico de Dallas e pastor da histórica Moody Memorial Church, em Chicago, EUA. Além de um trabalho muito intenso em programas de rádios, é autor de diversos livros, incluindo A serpente no paraíso; De pastor para pastor; Sete razões para confiar na Bíblia; e Um minuto após a morte, todos publicados pela editora Vida. Na entrevista que segue, fala de um intrigante assunto de um de seus livros que trata sobre as mentiras mais comuns que têm sido difundidas sobre Deus.

Defesa da Fé: Quais seriam, sob seu ponto de vista, as principais mentiras sobre Deus que mais têm conquistado a simpatia do homem contemporâneo?

Erwin Lutzer: Bem, certamente são muitas. Mas, depois de certo crivo, cheguei a uma seleção de pelo menos dez grandes mentiras muito difundidas hoje em dia. São mentiras que têm enganado a muitos, infelizmente. As afirmações mentirosas a que me refiro são as seguintes: “Deus é tudo o que queiramos que Ele seja”, “Muitos caminhos levam a Deus”, “Deus está mais tolerante do que costumava ser no passado”, “Deus nunca sofreu”, “Deus é obrigado a salvar os seguidores das outras religiões”, “Deus não se responsabiliza pelos desastres da natureza”, “Deus não sabe de antemão quais decisões tomaremos”, “A queda de Adão e Eva arruinou o plano de Deus”, “Devemos escolher entre o prazer de Deus e o nosso” e “Deus ajuda a quem se ajuda”.

Defesa da Fé: De fato, são várias, e algumas delas renderiam muito diálogo, mas procuraremos nos concentrar em apenas algumas. Vamos começar com a segunda. Por que não é verdade que muitos caminhos levam a Deus?

Erwin Lutzer: Antes, por favor, permita-me uma contextualização. Desde muito tempo, prospera, em muitos círculos, a ideia de que existem muitas maneiras de se chegar a Deus. Os credos e declarações doutrinárias saíram de moda e estão em alta os sentimentos e emoções. Muitos acreditam que, para sermos espirituais, a crença não apenas é desnecessária, mas, também, indesejável. O cristianismo está sendo, de tal forma, redefinido que está cada vez mais difícil distingui-lo do budismo ou de outras ideias religiosas orientais. Hoje, acredita-se que podemos ser espirituais sem Deus, sem “crenças”. E, com essa guinada para o panteísmo, também cresceu a intolerância para com o cristianismo histórico. Nas últimas duas décadas, o pecado foi definido como algo inexistente. Há quem entenda que, se existe algum pecado, este é pensar que outra pessoa possa estar errada em termos de religião. Dizem que a verdade não é algo para ser descoberto, mas, sim, construído, manufaturado, tanto individualmente quanto por consenso. A moda é a autossalvação por meio do autoconhecimento. O sentimento de uma pessoa é mais importante, digamos, que as palavras de Jesus. Nossa cultura pluralista rejeita abertamente a afirmação de que só se pode chegar a Deus por um único caminho. A unificação de todas as religiões parece um objetivo tão digno de ser alcançado que os que se opõem são vistos como arrogantes e, obviamente, intolerantes. Mas, a Bíblia deixa claro que Deus lida conosco por meio de Jesus Cristo. Permanecer na presença de Deus sem a representação de Cristo seria como ficar a apenas algumas centenas do sol: a santidade de Deus nos consumiria. Não podemos ter a ousadia de, sequer, pensar que é possível entrar na presença de Deus sozinho. O texto bíblico é claro: “Pois há um só mediador entre Deus e os homens: o homem Cristo Jesus, o qual se entregou a si mesmo como resgate por todos” (1Tm 2.5).

Defesa da Fé: Considerando a relação metafórica que traçou entre o sol e a santidade divina, não seria mesmo incorreto afirmar que Deus está mais tolerante do que costumava ser no passado?

Erwin Lutzer: Certamente. Na verdade, quem pensa assim costuma entender que há dois deuses distintos: um Deus irado no Antigo Testamento e outro benevolente no Novo Testamento. Descobri cerca de doze diferentes pecados ou transgressões que a lei judaica considerava crimes capitais nos tempos do Antigo Testamento. Hoje, tudo mudou. Os homossexuais são convidados a vir às nossas igrejas; os pais são instruídos a amar incondicionalmente seus filhos rebeldes; adúlteros passam por sessões de aconselhamento. Não ouvimos mais histórias como a de Nadabe e Abiú, feridos mortalmente por oferecerem “fogo profano” ao Senhor (Nm 26.61). Não lemos mais sobre pessoas como Uzá, que tocou a arca em desobediência às instruções dadas por Deus e foi morto instantaneamente (2Sm 6.7). Hoje em dia, aparentemente, as pessoas podem ser irreverentes e blasfemadoras o quanto quiserem e, ainda assim, chegam à velhice. Esta questão nos atinge porque queremos saber se temos a liberdade para pecar arcando com o mínimo de consequências e também porque queremos saber se podemos depender de Deus para nos vingar quando alguém peca contra nós. Defendo a ideia de que, conforme a humanidade muda, mudam também nossas ideias sobre Deus.

Defesa da Fé: Mas isso não implicaria em admitir que Deus é mutável?

Erwin Lutzer: De forma alguma! A natureza de Deus não muda. A verdade de Deus não muda, pois Ele nunca precisa revisar suas opiniões ou atualizar seus planos. Os padrões de Deus não mudam, mas a administração de Deus mudou. Deixe-me ilustrar o que quero dizer. Quando um menino de quatro anos de idade foi pego roubando doces de uma loja, seu pai deu-lhe uma surra. Suponhamos que o mesmo rapaz roubasse doces com doze anos. Provavelmente, seu pai escolheria outra forma de castigo, como, por exemplo, a privação ou perda de algum privilégio. Se o rapaz repetisse a prática aos vinte anos, é possível que o caso fosse discutido em um tribunal. O que quero dizer é que a opinião de Deus não mudou. Suas penalidades ainda são severas, mas existe uma mudança no momento em que são aplicadas e no método de punição. Em nossos dias, Deus permite que o pecado se acumule e “retarda” seu julgamento, mas, quanto maior a graça, maior a punição por recusá-la. A graça divina dá a alguns a ilusão de tolerância. Essas pessoas confundem a paciência de Deus com leniência. A quem acha que Deus é mais tolerante hoje, convido a imaginar Jesus se curvando ante o peso de nosso pecado. Pelo calvário aprendemos que devemos suportar pessoalmente a pena por nossos pecados ou, então, devemos deixá-los sobre os ombros de Cristo. Em qualquer um dos casos, as penas apropriadas e justas serão exigidas. O filho de Deus suportou o fogo que estava vindo em nossa direção. Somente os que servem ao Senhor estarão livres das chamas eternas.

Defesa da Fé: Se Deus não está mais tolerante, então, Ele não é obrigado a salvar os adeptos das demais religiões, diferentes do cristianismo, como muitos acreditam?

Erwin Lutzer: Logicamente que não! As Escrituras exigem que vejamos as outras religiões como tentativas fracassadas que o homem empreendeu para alcançar Deus por meio de esforços humanos e iluminação intelectual. Paulo fez duas considerações sobre o paganismo. Em primeiro lugar, disse que os que adoram ídolos estão, na verdade, adorando a demônios (1Co 10.20,21). Em segundo, Paulo ensinou que as religiões prosperam porque o homem não honra o verdadeiro Deus. Por causa da rebelião, os homens “trocaram a glória do Deus imortal por imagens feitas segundo a semelhança do homem mortal, bem como de pássaros, quadrúpedes e répteis” (Rm 1.23). Uma das características da idolatria é sempre confundir a criatura com o Criador. Satanás orquestrou as falsas religiões, oferecendo uma infinidade de opções, mas todas contrários ao evangelho de Cristo.

Defesa da Fé: Nesse contexto, não existiriam religiões mais próximas do caminho apontado na Bíblia?

Erwin Lutzer: Não posso negar que existam alguns bons ensinamentos éticos em outras religiões. O budismo, em particular, enfatiza uma forma de devoção altruísta que parece ter alguma coisa em comum com o cristianismo. Isso é de se esperar, já que todas as pessoas foram criadas à imagem de Deus e têm consciência moral. Mas uma religião não precisa ser totalmente falsa para que seja desastrosamente errada. As outras religiões fracassam na questão mais importante, ou seja, a maneira pela qual os pecadores podem se reconciliar com Deus. Independentemente do nosso desejo de ver os não cristãos salvos, devemos ter cuidado quanto a sermos mais brandos do que o ensinamento bíblico permite.

Defesa da Fé: Entendido! Vamos mudar de tópico. De que forma entende que Deus poderia ser responsabilizado pelos desastres da natureza, desde que o contrário disso, segundo o senhor, seria uma mentira?

Erwin Lutzer: Bom, além de trabalhar com a ideia de responsabilidade, adiciono a noção de controle. Deus está no controle de tudo. As Escrituras deixam claro que a natureza está decaída (Gn 3.17,18). Se quisermos beleza e simetria, devemos cuidar do jardim, o que não temos feito. Muito pelo contrário! Quando Deus amaldiçoou o homem, também amaldiçoou a natureza. Assim como após a queda passamos a ter o nosso lado bom e ruim, a natureza também os tem. Agora a natureza aguarda a nossa redenção, de modo que possa ser redimida juntamente conosco. Felizmente, a maldição será revertida um dia (Rm 8.19-21). Todos os dias, vemos o resultado da maldição: maremotos, terremotos, tornados, furacões, secas e inundações. Mas quando pensamos nisso, precisamos fazer distinção entre as causas imediatas e a causa final desses acontecimentos.

Defesa da Fé: Poderia dar um exemplo sobre essa distinção?

Erwin Lutzer: Logicamente. A causa imediata de um terremoto, por exemplo, é a falha abaixo da crosta terrestre. A causa imediata de um tornado, por exemplo, são os ventos de um determinado padrão de temperatura. Mas a causa final de ambos os exemplos é Deus. O Senhor governa a natureza diretamente ou por causas imediatas. Mas, seja qual for a maneira de agir, Deus está no controle, pois Ele é o Criador e sustentador de todas as coisas. O Deus que permite a existência de catástrofes naturais pode optar por não permitir que aconteçam (Jó 1.12). Algumas vezes, as Escrituras mostram Deus como quem controla a natureza, mesmo que não existam causas imediatas (Mc 4.39). Se é verdade que o Senhor revela seus atributos por meio da “manifestação positiva” da natureza (e sabemos que é!), por que as calamidades na natureza também não revelariam alguma coisa sobre seus outros atributos? Se a natureza serve para nos dar uma visão equilibrada sobre Deus, também devemos ver nela seu julgamento, embora não possamos transformar isso num dogma (Gn 6.17, Nm 16.31-33, Jn 1.4). Se você encontrar um cristão que se oponha à ideia de que Deus seja a causa final das condições do tempo, verá essa pessoa mudar sua teologia quando estiver no meio de uma tempestade de relâmpagos e trovões. Podemos tentar distanciar Deus desses acontecimentos, mas, no momento em que curvarmos a cabeça em oração, saberemos que o Senhor está no controle!

Defesa da Fé: No contexto desta soberania divina, fale um pouco sobre a mentira de Deus não saber quais decisões iremos tomar.

Erwin Lutzer: A origem desta ideia absurda está na existência de um Deus finito, no qual não podemos acreditar, pois é diametralmente diferente daquele que as Escrituras apresentam. Ele próprio declara: “Desde o início faço conhecido o fim, desde os tempos remotos, o que ainda virá” (Is 46.9,10). Nosso Deus zomba dos ídolos que não conhecem o futuro (Is 41.21-23). Deus é onisciente e totalmente confiável, sendo a precisão das profecias a prova mais cabal dessa minha afirmação. Deus não precisa ler um jornal diário junto conosco para ficar atualizado sobre a situação do mundo. Deus nos conhece plenamente (Sl 139.1-3). Deus nos conhece continuamente (Sl 139.7,8). E Deus nos conhece profeticamente (Sl 139.13-16).

Defesa da Fé: Então, a queda do homem no Éden não arruinou os planos de Deus?

Erwin Lutzer: Absolutamente! Muitos indagam por que Deus criou o Universo e o homem se conhecia as consequências da queda do homem. Para os tais, a criação do homem só faz sentido se aceitarmos que Deus não conhecia o futuro. Ledo engano antibíblico! Jonathan Edwards foi muito feliz (ou melhor, inspirado) quando afirmou que Deus criou tudo para o “transbordar da sua glória”. John Piper destaca que Deus serve continua e incansavelmente a si mesmo, e tudo o que existe contribui para a sua glória. A cruz de Cristo foi planejada desde a eternidade (At 2.23, 4.27,28). Deus esquematizou a cruz nas distantes eras da eternidade porque planejou nossa redenção antes mesmo de nos criar (2Tm 1.9). O Deus que criou todas as coisas planejou que a Igreja disseminasse sua sabedoria e este foi seu “eterno plano”! Não é de surpreender que não consigamos separar a criação da redenção. O propósito inicial de Deus era redimir e a criação era o passo necessário para que isso se realizasse. Sem criação, não haveria criaturas redimidas para mostrar a sua glória. Sem uma Igreja, sua multiforme sabedoria na salvação não teria sido manifesta. Desde eras inimagináveis, Deus sabia que derramaria sua graça a nós. Colocando de outra forma, se você é redimido, nunca houve uma época em que Deus não o tivesse amado. É por isso que João pôde dizer que os nossos nomes estavam escritos no livro da vida “desde a criação do mundo” (Ap 13.8). Havia uma cruz no coração de Deus muito antes de uma cruz ser levantada no monte Calvário!

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