Religiões



Xintoísmo - A religião do Japão, a terra dos deuses


Faze-me conhecer, SENHOR, o meu fim, e a medida dos meus dias qual é, para que eu sinta quanto sou frágil (Sl 39.4)


Uma das profissões de fé mais antigas do mundo, o xintoísmo é uma religião étnica, ou seja, é a religião de um único povo, no caso, o japonês, que se formou no interior deste e com ele cresceu, a ponto de povo e religião formarem uma só coisa com a cultura, a história e a mentalidade. Por essa qualidade, o xintoísmo não é uma religião proselitista, ou seja, não envia missionários para difundi-la entre outros povos; a única tentativa foi feita na Coréia durante o período de ocupação colonial no séc. VI.

Em sua origem, o xintoísmo não possuía nome, doutrina nem dogmas. Constituía-se de um conjunto de ritos e mitos que explicavam a origem do mundo, do Japão e da família imperial. Os protagonistas desses mitos eram os Kamis, deuses ou energias divinas que habitam todas as coisas e se sucedem por gerações, desde a criação do mundo. Recebe o nome de xintoísmo (caminho dos deuses) para distinguir-se do confucionismo e do budismo.

A diferença do xintoísmo em relação às demais se define por não se tratar de uma instituição baseada em um sistema exclusivamente de crenças, possuindo mais de uma definição, dentre as quais uma delas enxerga a religião como uma maneira muito familiar de vida e que também se associa a lugares familiares. Essa religião desenvolveu-se naturalmente entre seus nativos, os quais aprenderam a aplicar seus valores e atividades diárias a conceitos que se relacionam com a questão religiosa, formando então a receita que propaga todo o conjunto. Por causa desse caráter, o xintoísmo que não goza de um corpo doutrinário bem definido e dotado de organização, nem tampouco um código de conduta coeso e sistemático.


O que significa "xintoísmo"

O termo nipônico shinto se origina em uma nomenclatura chinesa transcrita como shen-tao, ambas traduzidas por "caminho dos deuses". Todavia, a aplicação deste termo à religião japonesa só ocorreu no século VI d.C., e isso, com a finalidade de evidenciar sua distinção do budismo.

Com relação à terminologia, vale destacar uma característica xintoísta, que se refere à noção que se tem de Kami que refere-se ao conceito do poder sagrado que crê-se existir tanto no inanimado quanto naquilo que tem vida. Eruditos da fé xintoísta definiram o termo e seu significado, explicando que esta religião mostrava um poderoso senso de presença de deuses e de espíritos que estão ligados à natureza, aos quais se atribui o termo Kami, traduzido nesta ótica por "seres superiores", o que propicia a veneração a estas personalidades do além.

O contingente declarado destes seres impossibilita a criação de um rol sistemático que sirva a uma organização na adoração e mesmo planejar uma hierarquia sistematizada, de forma estável.

O xintoísmo prega que o primeiro "deus" celestial teria dado orientações a Izanagi e a Izanami, divindades macho e fêmea do panteão japonês, para que criassem o mundo e em particular as ilhas que compõem o território japonês.

Empregando, segundo a crença, o processo de geração sexual, criaram então a terra, os kami (deuses) dos montes, das árvores e dos riachos, o deus do vento e o deus do fogo, assim prosseguindo até a constituição completa do planeta.

Mesmo considerando suas personagens que usufruem poderes de divindades, a linha que as separa dos homens é por demais estreita. Os japoneses xintoístas acreditam que descendem dos kami (deuses), e que a linhagem dos imperadores deriva de uma potestade superior chamada Amaterasu. Essa teria enviado seu filho, Ni-ni-gi, para a terra (Japão), a fim de governá-la em seu lugar, providencia que determinou a procedência da linhagem imperial japonesa. Foi esta tradição que impôs em tempos hodiernos um xintoísmo que determinou a expansão nacionalista.

Outra divisão um pouco confusa é verificada entre os kami (deuses), que supostamente se dividem entre os pessoais e os impessoais. Os impessoais são os que não se associam a lugares ou coisas particulares, o que atribuiria personalidade a estas entidades. Além disso, vale também ressaltar que a mitologia que cerca alguns deuses e deusas é estritamente antropomórfica, isto é, procura atribuir forma humana a santidades às quais se devotam.


O cânon xintoísta

Apesar de os xintoístas não cultivarem a crença de que volumes isolados possam apresentar veracidade quanto a revelações plenamente inspiradas, e sobre as quais a religião esteja alicerçada, atribuem sacralidade a dois volumes de sua literatura, os quais exercem influência sobre o comportamento do povo. São eles: O Ko-ji-ki, ou "registro das questões antigas" e Nihon-gi, as "crônicas do Japão". O primeiro contém grande carga de mitologia, lendas e enredos históricos ligados ao desenvolvimento da civilização japonesa. O segundo, com certa semelhança, traz em seu conteúdo a crônica sobre a origem do Japão e os fatos decorridos até o ano de 700 d.C.

A escrituração de ambas é atribuída a uma mesma época e data aproximadas (720 d.C.), e se prestam a narrar os eventos sucedidos no Japão cerca de mil e trezentos anos antes, antecedência que não as impede de serem classificadas como obras recentes, posta a antigüidade histórica do xintoísmo.


Desenvolvimento do xintoísmo

Como religião puramente japonesa e considerando a antigüidade desta nação, constatamos que sua fundação também jaz num período remoto.

O amor e o respeito que o povo japonês declina em louvor aos seus arquipélagos fomentam a crença de que desta região tenha principiado toda a criação divina, idéia que percorre a linha do tempo da história xintoísta, juntamente com seus conceitos inaugurais.

Este idealismo nacional e amor pátrio são os pontos de maior relevância quando o assunto é a presença exclusiva desta cultura religiosa apenas em solo japonês. A crença a respeito da divindade deste território, embora antiga, surgiu como dogma bem mais tarde. Para os xintoístas, o Japão seria "o centro do nosso universo de fenômenos". É dessa crença que surge o nome do país, dado pelos próprios nativos: Nippon, significando "a origem do sol".

Enquanto durou a segunda guerra mundial, era comum o ensino que transmitia às crianças a respeito da procedência divina dos imperadores japoneses, supostamente provenientes da deusa Amaterasu. Ainda segundo a tradição, essa deusa teria concedido à casa imperial japonesa o direito divino de governar, entretanto, esta prerrogativa encontra seu fim em 1946, quando o imperador Hiroito repeliu este suposto direito divino de administração temporal.

Até 552 d.C. o xintoísmo usufruía primazia no Japão, porém, daí em diante, encontramos o budismo em ascensão, conquistando popularidade entre os nipônicos. Já em 645, Kotoku, imperador da época, adere ao budismo, repelindo o xintoísmo com todos os seus ideais, práticas e cultura patrióticas. Entre 800 e 1700, o xintoísmo aparece dando os primeiros sinais de adesão ao sincretismo, misturando sua essência com elementos budistas e confucionistas. Nessa época, a modalidade de xintoísmo que poderíamos qualificar como "raiz", sofreu um drástico declínio.


Pontos básicos da doutrina xintoísta

Por volta do ano de 1700 o xintoísmo vivencia um avivamento, com o qual estudiosos contribuíram analisando textos arcaicos relacionados às origens mais remotas dessa crença japonesa.

Hirata, um dos mais eruditos membros de grupo de cooperação avivalista, pronunciou-se a este respeito afirmando que as duas doutrinas xintoístas fundamentais são: O Japão é o país dos deuses e, conseqüentemente, seus habitantes são descendentes destas divindades. Entre o povo japonês e os chineses, os indianos, os russos e os outros povos do mundo, há uma diferença de espécie, e não somente de grau, segundo ressalva. O Mikado (termo usado por estrangeiros para se referirem ao imperador) é o verdadeiro filho do céu, o qual tem o direito de reinar sobre os quatro oceanos e também sobre os dez mil países.

No que concerne à adoração, destaca-se no xintoísmo, à semelhança de outras religiões orientais, um panteão de deuses que impede práticas sistemáticas de culto a todos. As obras sacras do xintoísmo ensinam que apenas algumas das muitas divindades possuem consideração para que possam ser adoradas com solidez, mas há uma que se destaca das demais. A Amaterasu, "a grande deusa do sol".

Esta divindade possui um grande e exclusivo santuário imperial dedicado apenas a sua adoração, e está localizado em Isé, acerca de trezentos e sessenta quilômetros de Tóquio, sendo considerado pelos praticantes o principal centro de adoração do Japão. Proceder à adoração neste templo é rotina que remonta a tempos anteriores a Jesus Cristo.

Amaterasu, como principal divindade japonesa, tem sua sexualidade definida como feminina, já que se insere no ato da adoração que é dela que provém todos os antepassados divinos originados na cultura xintoísta, o que se constitui em elemento único, se considerarmos as principais formas de divindade cultuadas pelo homem ao redor do mundo.


Xintoísmo hoje

Atualmente, o xintoísmo não possui mais o caráter de religião oficial do Japão e tampouco é regulamentado politicamente. A derrota do Japão na guerra de 1945, durante a segunda guerra mundial, condenou o xintoísmo à abolição quanto a sua oficialidade religiosa. Esta queda retirou das mãos do Governo a administração dos santuários xintoístas, determinando até os tempos hodiernos, uma manutenção patrocinada pela iniciativa privada nacional japonesa.

Variadas seitas com características xintoístas têm surgido recentemente sendo muito comumente iniciadas por líderes locais que obtêm "revelações" através de experiências transcendentes. A maioria desses novos messias é, na verdade, mulher, característica contrastante em relação às demais religiões do mundo. Algumas dessas "novas religiões", chamadas shinko shukyo, são ainda do período de 1603 a 1868, como a Tenrikyo que tem Nakayama Miki (1798-1887) como fundadora, e cujo nome significa "Religião da Divina Sabedoria". Há ainda outras que surgiram entre 1868 e 1945 como a Omoto, a Hito no Michi e a Soka Gakkai. A Seich-no-Ie é de 1930, fundada por Masaharu Taniguchi.


O "caótico" panteão xintoísta

Segundo o xintoísmo, no princípio tudo era o caos e do caos surgiram as cinco grandes divindades xintoístas: Amenominakanushi, "o senhor do nobre centro celestial"; Takamimusubi, "o grande gerador do deus prodigioso"; Kamimusubi, "o divino gerador do deus prodigioso"; Umashiashikabihikoji, "o mais velho soberano do cálamo"; e Amenotokatachi, "o eternamente deitado no céu". Este último suscitou sete gerações divinas, sendo que destas, as duas últimas gerações, Izanagi (varão que atrai) e Izanami (mulher que atrai), foram responsáveis pela criação do arquipélago do Japão, no caso o mundo, e as inúmeras entidades secundárias, muitas das quais associadas a cada ilha. Esses dois seres teriam supostamente modelado a massa disforme que era o mundo (o caos) dando origem a dez filhos que representam os elementos da natureza: São eles: divindade da atmosfera, do vento, das águas, dos pântanos, do outono, das árvores, das montanhas, do barco de cânfora, a deusa do alimento e o deus do fogo.


Músicas e roupas para os deuses do xintó

Os deuses xintoístas gostam de música. Nesta religião a música é elemento indispensável para o chamamento das divindades, é o ritual a que os xintoístas denominam "Kagura". Desde os tempos mais remotos da religião a "Kagura" era empregada e crê-se que esse ritual seja capaz de abrandar os espíritos, além de divertir os deuses. Outra curiosidade sobre o panteão xintó é que todos os deuses vestem roupas aristocráticas confeccionadas por Amaterasu (a deusa do sol) e suas tecelãs. Isso legou um costume que atravessou séculos, pois até os dias de hoje são as sacerdotisas as responsáveis por tecer os trajes para as grandes cerimônias.

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