Pastor-presidente da Igreja Cristã da Aliança em Niterói (RJ)
Como muitas vezes ocorre, a Igreja evangélica brasileira polemiza sobre assuntos dos mais diversos. Na verdade, tem sido assim no decorrer recente de sua história. Ultimamente, tem-se falado muito sobre o Natal, sua história e implicações. Como era de se esperar, opiniões diferentes surgiram sobre o assunto. Existem aqueles que não veem qualquer problema na celebração da data e aqueles que radicalizaram, abdicando de toda e qualquer celebração relacionada ao tema em questão. Antes de qualquer parecer, convido os leitores de Defesa da Fé a algumas considerações.
O Natal não era celebrado entre as primeiras festas da Igreja primitiva. Os primeiros indícios da festa provêm do Egito. Os costumes pagãos ocorridos durante as calendas de janeiro lentamente modificaram-se na festa do Natal. Foi no século 5o que a Igreja Católica determinou que o nascimento de Jesus Cristo fosse celebrado no dia da antiga festividade romana, em honra ao nascimento do sol, isso porque não se conhecia, ao certo, o dia do nascimento de Cristo. Não se pode determinar com precisão até que ponto a data da festividade dependia da Brumária pagã (25 de dezembro), que seguia a Saturnália (17-24 de dezembro), que celebrava o dia mais curto do ano e o "novo sol". As festividades pagãs, Saturnália e Brumária, estavam, profundamente, arraigadas nos costumes populares para serem abandonadas pela influência cristã. A festividade pagã, acompanhada de bebedeiras e orgias, agradava tanto que os cristãos viram com benevolência uma desculpa para continuar a celebrá-la, mas com grandes alterações no espírito e na forma.
Logo, está claro que o Natal surgiu com a finalidade de substituir as práticas idólatras e pagãs que influenciavam a sociedade da época. Hoje, como no passado, a humanidade continua fazendo desta festa pretexto para bebedeiras, danças e orgias. Se não bastasse isso, sabemos, todos, que milhões de pessoas, nos países de todo o mundo (muitos desses, cristãos), levam seus filhos pequenos a acreditarem em Papai Noel, dizendo-lhes que foi o bochechudo velhinho que lhes trouxe um presente. Ora, a figura do Papai Noel tem origem nos países nórdicos, referindo-se a um senhor idoso, denominado Klaus, que saía distribuindo presentes a todos quanto podia.
Infelizmente, numa sociedade materialista e consumista, o tal Papai Noel é mais desejado do que o próprio Jesus de Nazaré. Afinal de contas, Klaus é o bom velhinho que satisfaz os luxos e desejos de todos quantos lhes escrevem missivas recheadas de vaidades e cobiças. Se isso não bastasse, adiciona-se a centralidade, em muitos lares cristãos, de uma árvore recheada de bolinhas coloridas.
O espírito consumista e mercantilista do Natal e a ênfase na árvore e no Papai Noel, são contrários à mensagem do evangelho, que anuncia que Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu único Filho para morrer por nós. Aliás, esta é a grande nova! Deus enviou seu Filho em forma de gente! Sem sombra de dúvidas, sou absolutamente contra tudo o que incentiva esse "espírito mercantilista natalino". No entanto, acredito que, antes de qualquer posição, decisão ou dogmatização sobre ao que fazer "do" e "no" Natal, devemos responder, sinceramente, a pelo menos três indagações:
Será que existe alguma festividade ou festa no mundo que tenha o poder de convergir tantas pessoas em torno da família e do lar como o Natal?
Em virtude da influência que o Natal exerce na sociedade ocidental, será que não deveríamos aproveitar a oportunidade e anunciar a todos quanto pudermos que um "menino nos nasceu e um filho se nos deu"?
Seria inteligente de nossa parte desconsiderar o Natal, extinguindo-o definitivamente do "nosso" calendário, em virtude do "espírito mercantilista natalino" que impera em nossa sociedade?
Apesar de não observarmos textos bíblicos que incentivem a celebração do Natal, é absolutamente perceptível, em diversas passagens, a importância e a relevância do nascimento e encarnação do Filho de Deus. As Escrituras narram, com efusão, o nascimento do Messias. Se não bastasse isso, sem a sua vinda, não nos seria possível experimentarmos a salvação eterna e a vida vindoura. Portanto, celebrar o Natal, ainda que saibamos que Jesus não nasceu no dia 25 de dezembro, significa, em outras palavras, relembrar a toda a humanidade "que Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jo 3.16). Sendo assim, é possível nos beneficiarmos dos aspectos positivos que o Natal proporciona.
Sim. É uma excelente oportunidade de evangelização. Em todos os registros históricos,percebemos,de forma impressionante, o quanto os irmãos primitivos eram apaixonados, entusiastas e extremamente corajosos na proclamação do evangelho. Esses homens e mulheres de Deus eram movidos por um desejo incontrolável de pregar as boas-novas. Eram pessoas provenientes de classes, níveis e posições sociais das mais diversas: artesãos, sacerdotes, empresários, escravos, gente sofisticada, pessoas simples e iletradas. Entretanto, ainda que diferentes, todos tinham em comum o sentimento de "urgência" em anunciar a Cristo.
Ressalto que Jesus comumente valeu-se das festas judaicas como meio de evangelização. Os quatro evangelhos nos mostram o Senhor pregando e ensinando coisas concernentes ao reino de Deus a um número considerável de pessoas em situações onde a nação celebrava alguma festividade. Na verdade, ele aproveitava os festejos públicos para anunciar as boas novas da salvação eterna.
Ora, tanto nosso Senhor quanto à igreja do primeiro século tinham como missão prioritária à evangelização. Portanto, acredito que o Natal seja uma excelente ocasião para anunciarmos o Senhor Jesus a nossos familiares e amigos. Afirmo isso porque, geralmente, é no Natal que a maioria das famílias se reúne.
O Natal nos propicia uma grande oportunidade de proclamarmos a Cristo com intrepidez. Junta-se a isso, o fato de que o período de fim de ano é um momento de reflexão e avaliação para muitos. E como é de se esperar, em um mundo em que a sociedade é cada vez mais competitiva e egoísta, a grande maioria das pessoas sofre com as dores e as marcas deste mundo caído e mau. É comum, nesta época, as pessoas chegarem à conclusão de que o ano não foi tão bom assim. A consequência disso é a impressão, na psique do individuo, de sentimentos como frustração, depressão, angústia e ansiedade. E, é claro, tais sentimentos contribuem consideravelmente para uma abertura maior à mensagem do evangelho.
Outro fator preponderante é a significativa abertura ao sagrado e ao sobrenatural que a geração do século 21 experimenta. No inicio do século 20, acreditava-se que, quanto mais o mundo absorvesse a ciência, menor seria o papel da religião. De lá para cá, a tecnologia moderna se tornou parte essencial do cotidiano da maioria dos habitantes da terra e permitiu que até os mais pobres tivessem um grau de informação inimaginável cem anos atrás. Apesar de todas essas mudanças, no início do século 21, o mundo continua, inesperadamente, místico. O fenômeno é global e, no Brasil, atinge patamares impressionantes.
Não faz muito tempo, a revista Veja encomendou uma pesquisa ao Instituto Vox Populi, que perguntou às pessoas se elas acreditavam em Deus. A maioria (aproximadamente, 99% dos brasileiros) respondeu que sim. Sem dúvida, o momento é ímpar na história, até porque, com exceção de alguns períodos da história mundial, o mundo nunca esteve tão aberto ao sagrado como agora. O fato é que o Natal, mesmo em meio ao consumismo desenfreado, ainda possibilita uma reflexão para algo além do mundo material.
Você já se deu conta de que a ambiência do Natal proporciona uma abertura maior à reconciliação e ao perdão? Repare quantas famílias se recompõem, quantos lares são reconstruídos, quantos pais se convertem aos filhos e quantos filhos se convertem aos pais. Será que a celebração do Natal não abre espaço nos corações para reconciliação e perdão? Ora, O Senhor Jesus é aquele que tem o poder de construir pontes de misericórdia e destruir as cercas da indiferença e inimizade.
O Natal nos oferece uma excelente oportunidade de sermos solidários em uma terra de solitários. Por acaso, você já percebeu que, no Natal, as pessoas estão mais abertas para desenvolver laços de fraternidade e compaixão com o seu próximo?
O Natal pode nos auxiliar a nos lembrarmos de que a vida deve ser menos solitária e mais solidária. Afirmo isso porque o Natal nos aponta o desprendimento de Deus em dar o seu Filho por amor a cada um de nós. O nosso Deus doou-se, sacrificou-se e nos amou pensando exclusivamente no nosso bem-estar e salvação eterna.
Você já se deu conta de que o Natal é uma excelente oportunidade para nos aproximarmos daqueles dos quais ninguém se aproxima, além de exercermos solidariedade para com aqueles que precisam de amor e compaixão?
Sem qualquer sombra de dúvida, devemos repulsar tudo aquilo que for reflexo do "espírito mercantilista natalino". Entretanto, acredito que, como portadores da verdade eterna, devemos aproveitar toda e qualquer oportunidade para semear, na terra árida dos corações, a semente da esperança. Jesus é esta semente! Jesus é a vida eterna! Jesus é o Filho de Deus, que nasceu, morreu e ressuscitou por nós. A missão de pregar o evangelho nos foi dada e, com certeza, cada um de nós deve fazer do Natal uma estratégia de proclamação e evangelização.
Celebremos, irmãos, e anunciemos que o Salvador nasceu e vive pelos séculos dos séculos.
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