O Dicionário Aurélio define usura da seguinte forma: "Delito cometido por quem empresta dinheiro, cobrando taxa excessiva de juros; agiotagem. Juro excessivo, muito além da taxa usual ou legal". Alguns autores, entre eles, Houaiss, derivam a palavra "juros" de "jus", "juris" ("direito, justiça"). Os juros seriam, portanto, o que é direito receber pelo aluguel de determinada quantia. No decorrer da história, vários conceitos e ensinamentos foram desenvolvidos sobre o tema. Alguns a favor, outros contra, nas mais variadas culturas, que usaram, por vezes, os termos "usura" e "juros" como sinônimos. Somente no século 18, quando as leis da economia começam a ser estudadas cientificamente, é que se propõe a distinção entre os vocábulos: "juros" e "usura", usando-se juro para designar a taxa de remuneração pelo uso do dinheiro e usura para o empréstimo de dinheiro a taxas superiores às legais.
Inicialmente, cumpre consignar que a usura teve diversas significações ao longo dos tempos, razão pela qual o seu estudo deve englobar, ainda, os contextos fáticos e sociais de cada época. A polêmica sobre os juros é que a cobrança excessiva sempre provoca maiores danos ao devedor. No conceito atual, usura não significa simplesmente o interesse devido pelo uso de alguma coisa. É o interesse excessivo, isto é, a estipulação exagerada de um juro, que ultrapasse ao máximo a taxa legal, ou a estipulação de lucro excessivo, ou excedente do lucro normal e razoável.
Vários códigos éticos mais antigos da humanidade já falavam sobre a usura, como o de Hamurabi, por exemplo. Aristóteles foi enfático ao condenar a usura. Condenava-a em qualquer forma. A tese dele era a de que a moeda, ao contrário dos seres vivos, não se reproduz, portanto, não poderia produzir filhotes.
O problema é o que caracteriza um juro abusivo. As taxas praticadas historicamente em diversos locais e povos variavam sensivelmente. Em Atenas, a taxa de juros era de 12% ao ano; na China, habitualmente, cobrava-se 12%, elevando-se a taxa se o empréstimo fosse a longo prazo, podendo atingir até 30%; em Roma, a taxa era de 12%, mas efetuavam-se empréstimos até 48%; na Idade Média, os lombardos e judeus cobravam taxa de 20%. Henrique VIII, na Inglaterra, em 1546, proibiu taxa superior a 10%; mas, nas colônias inglesas, notadamente na Índia, cobravam-se até 60%.
Desde muito tempo, a Igreja Católica se manifestou sobre os ganhos usurários, apesar de explorar o povo de outras formas. Basílio, em especial, e Tomás de Aquino, ao longo da Idade Média, também condenaram a usura. Essas condenações compartilham a característica de condenar qualquer cobrança de juros, sob o nome comum de usura, qualquer que seja a taxa praticada. Em 1745, o papa Benedito XIV promulgou a encíclica Vix Pervenit condenando a usura. Santo Tomás de Aquino tinha a usura como pecado contra a própria justiça. A usura, segundo a Igreja Católica, estaria ligada, ainda, à avareza e à preguiça, condutas claramente contrárias ao que se espera de um bom cristão.
Só no final do século 15 surgem os primeiros diplomas legais que estipulariam os valores cobrados pelo empréstimo de dinheiro. Passou-se, então, a distinguir juro de usura. Juro era a taxa cobrada dentro dos valores estipulados em lei; usura seria o termo utilizado para se referir à cobrança de taxas superiores ao limite máximo permitido legalmente.
O Brasil, no limiar de sua história, por ser colônia, submetia-se à norma jurídica de Portugal. Em 1446, as Ordenações Afonsinas já regulavam a usura. D. Pedro II, em 24 de outubro de 1832, sancionou a lei que exterminava com o limite de juros. Silenciam-se as Constituições de 1824 e 1891 sobre a usura ou sobre o limite das taxas de juros. Vigente, então, a lei de 1832, prevalece a livre negociação dos juros.
Em 1º de janeiro de 1917, entra em vigor o Código Civil de 1916, que estabelece o limite de 6% como juros devidos por força de lei ou quando não convencionado pelas partes. Já se tratava de um avanço no sentido de coibir a usura. Em 1933, Getúlio Vargas promulgou a Lei da Usura (Decreto nº 22.626/33), fixou um limite de taxa de juros de 12% ao ano, bem como a impossibilidade do anatocismo (cobrança de juros sobre juros) com periodicidade inferior a um ano.
A Constituição Federal de 1934 dispunha que a usura era proibida e seria punida na forma da Lei. Mesmo fenômeno ocorre com a Carta Constitucional de 1946. A Carta Magna de 1967 atribui poderes ao presidente da República e ao senado federal por intermédio da resolução de alterar os limites dos juros. Em 1951, foi promulgada a Lei nº 1.521/51, que versava sobre os crimes contra a economia popular. Assim, a usura passou ao estatus de crime, observando-se mais um expoente legislativo no combate aos abusos na cobrança de juros.
A Carta Constitucional de 1988, vigente em nosso país, determina que as taxas de juros reais não possam ser superiores a 12% ao ano. A cobrança acima deste limite é conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades. A despeito de ser reconhecida a prática da usura como proibida no país e de ser lei complementar, a prática usurária continuou e o teto jamais foi reconhecido pela Corte Constitucional.
O Supremo Tribunal Federal (STF), por intermédio da Súmula n° 596, alberga a possibilidade de os bancos ou agentes componentes do sistema financeiro nacional de cobrarem os juros no patamar que lhes melhor aprouver. Claro que a cada nova eleição presidencial a política financeira tem mudanças neste sentido. O STF editou a Súmula n° 121, na qual é vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada. Essa súmula impede, terminantemente, o anatocismo. Tal qual já dispunha o Código Comercial.
Em regra geral, a Bíblia condena a usura. Vejamos algumas passagens bíblicas:
Êxodo 22.25:- "Se emprestares dinheiro ao meu povo, ao pobre que está contigo, não agirá com ele como credor que impõe juros".
Levítico 25.35-37: "Se teu irmão empobrecer, e as suas forças decaírem, então, sustentá-lo-ás. Como estrangeiro e peregrino ele viverá contigo. Não receberás dele juros nem usuras; teme, porém, ao teu Deus, para que teu irmão viva contigo. Não lhe darás teu dinheiro com juros, nem lhe darás alimento para receber usura".
Deuteronômio 23.20: "Ao estrangeiro emprestarás com juros, porém a teu irmão não emprestarás com juros, para que o Senhor, teu Deus, te abençoe em todos os teus empreendimentos na terra a qual passas a possuir".
Salmos 15: 1, 2, 5: "Quem, Senhor, habitará no teu tabernáculo? Quem há de morar no teu santo monte? O que vive com integridade e pratica a justiça [...] o que não empresta o seu dinheiro com usura, nem aceita suborno contra o inocente. Quem deste modo procede não será jamais abalado".
Lucas 6.34,35: "E, se emprestais àqueles de quem esperais receber, qual é a vossa recompensa? Também os pecadores emprestam aos pecadores, para receberem outro tanto. Amai, porém, os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai, sem esperar nenhuma paga; será grande o vosso galardão, e sereis filhos do Altíssimo. Pois ele é benigno até para com os ingratos e maus".
Várias palavras, no grego e no hebraico, tratam, de forma geral, sobre o lucro:
Betsa ou batsa: "ganho desonesto, despojo" (Jz 5.19; Jó 22.3; Pv 1.19;15.27; Is 33.15; 56.11; Mq 4.13; Ez 22.13,27).
Mechir: "preço, aluguel" (Dn 11.39; Dt 23.18; 2Sm 24.24; 1Reis 10.28; 2Cr 1.16; Sl 44.12; Jr 15.13).
Tebuah: "aumento, fruto" (Pv 3.14; 8.19; 15.6; 16.8; Is 23.3; Jr 12.13).
Kérdos: "lucro" (Fp 1.21; 3.7; Tt 1.11). O verbo, kerdalno, "lucrar", aparece treze vezes no Novo Testamento (Mt 16.26; 18.15; 25.17,20,22; Mc 8.36; Lc 9.25; At 27.21; 1Co 9.19-22).
Porismôs: "obtenção, provisão" (1Tm 6.5,6).
Ergasla: "esforço, trabalho", com o sentido de lucro (At 16.16,19; 19.24). A forma reforçada, prosergâzomai, "visar o lucro", aparece uma vez, em Lucas 19.16.
Pleonektéo: "tirar vantagem de" (cf. 2Co 12.17,18).
Conforme se vê nesta lista, as palavras apontam para um lucro obtido por meio da violência, da injustiça (Jz 5.19); para os despojos (Pv 1.19); para o ato de alugar, de contratar (Mq 4.13); ou, então, para uma recompensa (Dn 11.39) e para o ganho mediante o ato de compra (Dn 2.8). Deus condena a usura e a riqueza desonesta (Jr 22.13; Tg 5.1-6; Ez 18.5-9).
Onde a ganância prevalece, aí surgem os abusos. A prática de hipotecar terras, às vezes, a juros exorbitantes, cresceu entre os judeus durante o cativeiro babilônico, o que violava diretamente a antiga lei mosaica. Assim, Neemias precisou arrancar um juramento da parte de seus compatriotas, a fim de que esse abuso tivesse um ponto final (Ne 5.3-13).
Os vocábulos gregos usados no Novo Testamento referem-se ao trabalho ou aos negócios (At 16.16,19); à vantajosa obtenção da vida eterna, adquirida por ocasião da morte biológica do crente (Fp 3.7); a algum meio de ganho (1Tm 6.5,6); a obter ganho ou lucro (Mt 16.26; 18.15; 25.17); e ao lucro por meio do comércio (Lc 19.16).
Resumidamente, portanto, um israelita não podia cobrar juros de um compatriota (Êx 22.25; Lv 25.36,37; Dt 23.19,20). Muitos deles praticaram a agiotagem, a despeito de isso ser-lhes vedado pela lei mosaica, que condena tal prática como desonesta e imoral (Pv 28.28; Ez 18.13; 22.12). Todavia, juros podiam ser legitimamente cobrados de estrangeiros que pedissem empréstimos (Dt 23.20). Sabemos que, nos dias do Novo Testamento, os juros cobrados sobre os empréstimos eram a regra econômica da época (Mt 25.27; Lc 19.23; Josefo, "Guerras" 2.17). Supõe-se que, na sociedade hebreia, a lei contra a cobrança de juros de algum irmão (compatriota israelita) prevalecia de modo geral, embora com abusos ocasionais.
Existem vários tipos de juros. No caso desta pergunta, pensamos que seja cobrar uma taxa por algum dinheiro emprestado. Jesus não condenou a prática de cobrar juros; mas não demonstrou apreciação pela prática da usura (Mt 6.19-21). Há um Senhor mais alto a quem devemos servir (Mt 6.24). Mateus 5.25,26 nos mostra que Jesus preferia atitudes amigáveis e hospitaleiras como fatores para ajudar na solução de problemas surgidos entre credores e devedores em lugar de coerção legal. No entanto, todos os cristãos devem pagar impostos nos países onde vivem. Essa é uma dívida legal e apropriada, conforme Romanos 13.6.
A usura está intimamente ligada à cobrança excessiva de juros e, por isso, constitui crime no Direito Penal brasileiro; aquele que pratica a usura é popularmente conhecido como agiota. Tal expressão se refere não somente ao particular, mas também às pessoas jurídicas que especulam indevidamente e ultrapassam o máximo da taxa de juros prevista legalmente, praticando crime contra o sistema financeiro nacional (Lei nº 7.492/86).
1. O que você considera um juro justo?
2. Um cristão que está nas mãos de um agiota deve denunciá-lo? O que fazer?
3. Sua igreja tem ministrado estudos sobre administração financeira?
4. A igreja tem obrigação de ajudar quem está passando problemas financeiros?
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